01 junho, 2008

Peixes dentro de um aquário bem apertado

Não há coisa mais interessante que observar pessoas.
Elas estavam encostadas ao bar. Cabelos lisos, escovados no cabeleireiro, unhas vermelhas, peles macias, rostos porcelanados pelo pó-de-arroz, olhos marcados pelo kajal, lábios brilhantes feito cerejas, roupas pretas, para emagrecer, saltos muito altos e o mesmo olhar vazio de todas as outras bonecas de porcelana que se acomodavam à sua volta. O cabelos tingidos de loiro, as costas eretas para exibir o busto, o olhar incessantemente sensual, como se sofressem de um eterno apetite sexual. Elas não sorriem, movimentam os lábios na horizontal, não abrem a boca nem mostram os dentes, são comedidas, não por timidez, mas por falta de expressão. Olham para o recinto apertado e escuro. Percebem cada olhar masculino sobre suas curvas e retribuem o olhar com um outro, de esgelha e conseguem até fingir o rubor das bochechas, mas é blush.
Elas permanecem encostadas toda a noite no bar, conseguem bebidas de graça soltando gracinhas para os garçons, não dançam, se embriagam e permanecem com suas poses de divas mesmo quando os calos dos seus sapatos não as deixam mais ficar em pé. São todas assim e todas, quase que ao mesmo tempo, olham para o outro lado do bar. Alguma coisa chamou atenção e não foram os machos. Duas mulheres pequenas. Duas mulheres que parecem meninas, perdidas naquele lugar. Elas cantam todas as músicas, sabem todas as letras, as que não sabem inventam. O canudinho serve de microfone para aquele furor. Duas meninas que se destacam por serem muito felizes. A felicidade delas incomodava e destoava do recinto. Os homens também começam a estranhar, mas a estranheza logo se transforma em perplexidade e interesse. As bonecas de porcelana substituem os olhares vorazes por um questionamento: o que as faz serem tão felizes? de que tanto riem? por que não se preocupam em fazer caretas e rir alto demais? por que não se incomodam com os cabelos à chuva? Por que tiram os sapatos quando os calos doem? E não encontram resposta. Essas duas pessoas pararam o lugar escuro e apertado. Mesmo minúsculas eram peixes grandes demais para aquele aquário, eram peixes de mar, não de criatório. Eram peixes que sabiam sorrir com a boca e com os olhos e com todo o corpo, peixes que não precisavam de motivos para sorrir. As duas pessoas peculiares desta história não faziam gracinhas para o garçon para ganhar bebidas, mas para pedir os morangos vermelhos que eles colocariam nos drinks, e saltavam e vibravam com as músicas como se fossem crianças.

2 comentários:

  1. E esse lugar jamais será o mesmo depois que esses peixes passaram por lá...
    Peixes felizes, sorridentes, espontâneos em sua ingenuidade,que ainda tentaram nesta mesma noite entender o motivo de algum peixe que estava em um aquário onde não sabia nadar, e eu até tentei ensinar...
    Preciso parar de me perguntar o motivo do resto não ser como somos, porque cada vez que faço isso, pareço nadar contra a correnteza e isso me atrasa bastante.
    Que nadem cada um em sua própria velocidade, e se, um dia, tivermos que nadar juntos, que seja só para dividir a experiência de novos lugares e de uma água mais clara e doce, então faremos...

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  2. Acabei de montar um protesto. As placas dizem: EXIGIMOS NOVOS POSTS!

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