08 outubro, 2008

A cama de Luisa


Um belo dia Luisa acorda com um lado da cama vazio e já não consegue dormir. Não importa o quão tarde tenha ido para cama, não importa o quão cansada, fatigada ou inerte, o fato é que Luisa tem um lado da cama que está vazio. Ela agora só dorme do lado direito da cama, o lado que não está encostado à parede. Isso por que ele agora só dorme do lado esquerdo, tanto da cama como do peito. Ela dorme do lado direito por que sempre acorda mais cedo e levanta-se mil vezes para fazer mil coisas e volta para aninhar-se nos braços dele outras mil vezes, interrompendo o seu sono. E Luisa não consegue ficar fora da cama, por que ali encontrou um ninho, no meio de um edredon fofo e quentinho. Luisa, narrando para a sua amiga Clara, conta que os braços dele são como enormes bolas de algodão, que a cercam, afagam e deixam apoiar sua cabeça. Luisa conta ainda que a casa que antes era só dela, agora não faz mais tanto sentido sem ele e que a escova de dentes dele no banheiro é sempre uma importante lembrança da sua presença.
Felizmente, suspira Luisa, a ausência dele não é sempre constante e o vazio da cama logo é preenchido por ele novamente. Por que ele lhe disse, num desses dias quaisquer, que cada pessoa é como um porto, com um barquinho que navega livremente, mas que sempre tem esse tal porto para onde voltar. E ele sempre volta para Luisa por que Luisa é o porto dele e ele o porto dela.
Contudo Luisa não sabe aonde tudo isso vai dar. Não sabe quanto tempo vai durar, se vai durar, se vai ficar sempre assim, aconchegada para sempre nas bolas de algodão. Luisa não sabe e não quer saber. Não pensa sobre isso, não projeta, não sonha, não espera nada, a não ser aquilo que lhe chega às mãos todos os dias. A única coisa que Luisa sabe é que, por enquanto, para ele a porta da sua casa vai estar sempre destrancada, o lado esquerdo da cama e do peito também. E esse "por enquanto" Luisa quer que dure para sempre.