29 dezembro, 2011

só um cigarro


às vezes dá vontade de ser fumante.
acender um cigarro para ter nas mãos
o objeto palpável do meu pensamento.
numa tragada preencher o corpo leve com a fumaça
e invadir os pulmões com a miséria do mundo.
na outra esvaziar o peito de todas as dores
e aproveitar o prazer de um breve momento.

28 dezembro, 2011

Reescreva meu roteiro



Diretor, quem foi o roteirista deste filme?
Achei o script uma piada de mau gosto.
Quero que seja escrito de novo.
Não foi assim que eu imaginei.

Corte essa cena.

Tire do meu peito esse coração abalado, coloque no lugar um vaso bem elaborado de flores de plástico. A poeira que juntar vai cumprir a função de truque de cenário.

Modifique esse plano de câmera.

Filme-me de baixo pra cima, nunca de cima pra baixo. Não coloque o peso do mundo nos meus braços, não deixe que a minha cabeça ocupe a maior parte da minha proporção. Pensar demais inquieta o coração.

Altere esse cenário.

Tire-me dessa mesa sempre vazia, onde eu apenas observo meu copo de vinho gelado, sem companhia, enquanto os figurantes se divertem numa língua que eu não compreendo. Coloque do meu lado alguém que sempre segure a minha mão.

Risque esse parágrafo.

Essa pose de mulher independente que vive para o trabalho. Quem só trabalha, não vive, já dizia o ditado. E se a vida for só trabalho que valha a pena o desperdício, o estrago.

Pule esse capítulo.

Eu não quero superar dificuldades e vencer obstáculos. Nesse roteiro mal feito, a vida parece ser uma corrida de barreiras e a morte o pódio da superação. Mas eu não sou atleta, que fique bem claro. Arrume outra opção.

Reescreva esse ato.

Tire do meu coração o fardo que é estar apegado. Eu quero muito menos lágrimas e, se possível, o desprendimento de não sentir nada. Coloque em vez disso algumas viagens, uma estrada sem destino, uma bicicleta sem freio, um desejo simples de placa de camião.

Engrandeça esse desfecho.

Faça do meu roteiro um grande feito e do seu desfecho uma libertação. Sem o estrondo de uma película americana, sem o peso de uma tragédia grega, apenas com a leveza de um sono sem hora para acordar, apenas com a sutileza da água que ferve naquela panela tão velha, que está no fogão.

26 dezembro, 2011

o mundo todo


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a gente pode não ter 
a mesma visão de mundo,
mas tem o mundo todo
pra ver juntos.

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