22 setembro, 2010

Síndrome de Estocolmo

O título pode parecer estranho, mas a história é tão comum.

Eu não sei se você sabe, se já ouviu falar, mas eu vou situar você mesmo assim. A Síndrome de Estocolmo é um estado psicológico que as vítimas de sequestro desenvolvem, em alguns casos desse tipo de violência. É um estado no qual a vítima cria um laço emocional com o sequestrador a fim de conquistar a sua simpatia e se manter salva de violências piores. Nada mais é do que um mecanismo de defesa da psique. Qualquer gesto de gentileza por parte do sequestrador é automaticamente interpretado como bondade e, por isso, a vítima raramente tem uma visão coerente da realidade. A vítima então se vê presa a um misto de amor e ódio pelo sequestrador, sentimentos que partem de um profundo estresse físico e emocional.

Agora substitua as palavras vítima e sequestrador, por mulher e homem, garoto e garota, namorado e namorada, esposa e marido. Todos os dias eu vejo mulheres que, sem nem saber o nome da própria "doença", vivem uma Síndrome de Estocolmo amorosa sem precedentes. Eu vejo, eu conheço e eu passei pela mesma Síndrome. Claro que no amor, se é que este post se trata de alguma espécie de amor, as situações são diferentes. Mas os sentimentos, esses sim são tão iguais.

Que mulher nunca teve um relacionamento do qual não conseguia fugir com medo de sair ainda mais magoada do que a mágoa que sofria todos os dias? Que mulher nunca se submeteu a transtornos emocionais tão terríveis a que faziam deixar de enxergar da realidade? Ou ainda, qual foi aquela que pensou algum dia "ruim com, pior sem" ? Se não todas, a maioria já passou por isso.

Há uns tempos eu conversava com uma amiga e comentamos que, tanto eu quanto ela ficavamos com o nosso coração acelerado quando viamos nossos o ex-namorados por aí (ex-namorados aqui relacionado ao mais longo/louco relacionamento de cada uma). Qualquer pessoa poderia abrir a boca, equivocadamente, e dizer: "Ah, se acelera o coração é por que você ainda gosta dele."

Mentira. Eu não gosto dele. Ela não gosta do dela. Nós apenas sofremos tanto na mão de cada um deles que todos os sentimentos de ódio, nervosismo, medo, fúria, insegurança, rapidamente se encarragam de descarregar a mais pesada adrenalina no corpo. Aquele nó no estômago. Nós sabemos perfeitamente como foi difícil sair do relacionamento. Por que todo sequestrador é um algoz. E nem adianta dizer: "Mas porquê não levar as coisas com mais leveza?" ou ainda "Você tem que ser mais você, ter amor-próprio!". Um sequestrador não tira um raio-x da sua auto-estima antes de te sequestrar. Ele vai lá, te pega de surpresa e pronto. Faz o serviço. E faz muito bem. E você sempre está desprevinida. E qual é o preço que você paga? Ou o seu resgate ou a violência.

E aí entra a Síndrome de Estocolmo de novo. Pagar o seu resgate é sempre tão caro. É sempre você ter que passar por cima daquele afeto doentio que você sente, é sempre você tentar abdicar do delírio que você criou, sempre tentar para de justificar que a violência dele é pontual "e só acontece quando ele está mal" e sempre tentar agradar, perdoar e compreender a quem, na verdade, você devería punir. Tanto pro sequestrador como para a vítima, o caminho mais fácil é a violência. Permanecer calada, com o amor-próprio caindo em alguma vala sem fundo. Por que pra quem está com os dois pés bem enfiados na lama, é mais fácil permanecer do que tentar sair. Permanecer sendo destratada, humilhada e infernizada sem a menor piedade, mas pontuada com um ou dois gestos de ternura. que servem pra se agarrar como prêmio de consolação. Permanecer naquele "amor" insano, intranquilo, intenso demais, cheio de lágrimas, dramas, brigas, (aquelas que todo mundo diz que é normal, mas normal mesmo é ser feliz) idas e vindas, pedidos de desculpas, desrespeitos, grosserias, vozes alteradas.

Tanta gente passa por isso. Eu já passei por isso.

A Síndrome de Estocolmo é o sentimento mais comum do mundo. O mais presente nos relacionamentos doentios que tantas mulheres vivem todos os dias e nem percebem que é tão grave assim. É uma doença. Tem cura? Sim. Acaba? Sim, um dia acaba de fato, e a gente chega ao limite do corpo e ao ponto do surto. Mas acaba e a gente descobre que nem morreu. Algumas conseguem fugir do cativeiro mesmo sentindo a mente presa por uns tempos. Só algumas. Mas para a maioria o sentimento é eterno e inesquecível. Não o amor, esse na verdade nunca existiu de fato por que psicose amorosa não é amor de espécie nenhuma. Mas o ódio só de ver aquela pessoa passar, sim, permanece. E nem adianta dizer que o ódio é o amor recalcado ou mal resolvido. O ódio é o ódio e pronto.

E depois de anos (até!) nesse esquema louco, você reza (e se esforça) para ir esquecendo, nem que seja aos poucos. E nem guarda foto para não precisar um dia encontrar e recordar. E depois você ainda toma cuidado e olha sempre onde pisa e pros dois lados, por que ser sequestrado uma vez não garante imunidade contra esse ou outros demais crimes.